E, apesar de não subscrever na totalidade, tenho de concordar com João Pereira Coutinho que escreveu no Expresso do último sábado:
INFERNO
FEIRA DO LIVRO
Assisti à polémica da Feira do Livro com a náusea que a coisa inspira. Antes de mais, uma confissão: a última vez que fui à Feira terá sido no século passado, ou seja, antes da Amazon me bater à porta e de atirar o meu gerente de conta para o divã. E então penso: como era possível viver sem a possibilidade cómoda de ler o que se publica em França, em Inglaterra, no Brasil ou nos EUA? Como alguém diria, éramos assim absurdos em 1997.
E continuamos absurdos: as livrarias tradicionais não se recomendam. Tirando as novidades, livros com dois ou três meses desaparecem para parte incerta. Os clássicos da língua não estão editados, ou estão mal editados - isto num país que discute acordos ortográficos! E algumas preciosidades esgotaram e não voltaram ao mundo dos vivos. Exemplos? Há meses que procuro as cartas de Séneca a Lucílio. Nada. A Gulbenkian promete reedição para breve. Andamos nisto há um ano.
E depois é a Feira propriamente dita: o ambiente é fúnebre. E piora quando os autores falam, ou assinam, com o entusiasmo próprio das tumbas. Restam os leitores - ou, para sermos rigorosos, os "leitorais sazonais". São como os estudantes universitários que só se lembram que o álcool existe quando chega a Queima das Fitas. Resultado: consomem muito e muito mal.
E a polémica? A polémica teria sentido se alguém estivesse interessado em enviar a Feira para o século XXI. Mas a Feira toda. Ninguém está. De um lado, os pequenos editores revisitam a conversa da ética igualitária: são pobres mas honrados, de preferência no interior das suas modestas "barracas" (o termo é todo um programa) e a marchar contra o "grande capital". Do outro lado, o "grande capital" pretende simplesmente exibir-se com a vulgaridade típica do novo-riquismo. Que saudades dos grandes cavalheiros que não só não discutiam dinheiro como nunca o ostentavam.
Mas esta é uma polémica sem cavalheiros. É uma luta entre o arcaísmo da APEL e a saloiíce da Leya. Uma feira, não de livros, mas de vaidades. Estão bem uns para os outros.
2 comentários:
O último parágrafo é muito certeiro. Mas eu confesso que continuo a gostar de passear entre os livros embora a feira do porto tenha demasidos editores que realmente não me interessam. E nunca saio de lá sem que algo me tenha tentado!
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